No dia 30 de novembro, foi promulgada a Lei nº 12.529, de 2011, que altera substancialmente o regime concorrencial anterior, notadamente quanto ao momento da submissão do ato de concentração à análise do Cade, cujo controle passou a ser obrigatoriamente prévio. Nesse sentido, restou revogado o artigo 54 da lei anterior, que permitia a apresentação a posteriori dos atos de concentração.
Com efeito, o artigo 88 da nova lei prevê que os atos de concentração (tais como fusão ou incorporação entre sociedades independentes ou aquisição de ações de controle), envolvendo empresas com faturamento anual bruto superior a R$ 400 milhões, não poderão ser consumados antes da apreciação final do Cade, devendo, enquanto a operação não for autorizada, ser preservadas as condições de concorrência. Isso significa que, enquanto a autarquia não se manifestar, uma série de medidas não poderão ser tomadas, tais como a integração de operações, criação de sinergia, ou a atuação coordenada.
Adicionalmente, o parágrafo 2º do mesmo artigo 88 estabelece que o exame do ato pela autarquia deverá ser concluído em até 240 dias contados da submissão, tendo sido suprimida, todavia, a aprovação tácita do ato na hipótese de ausência de manifestação até o término do prazo acima, conforme constava na redação do projeto de lei que deu origem à norma.
A prática irá se encarregar de apontar soluções para a proteção das partes
Embora louvável a alteração promovida pela Lei nº 12.529 (que, vale lembrar, alinha a sistemática legal brasileira às melhores práticas internacionais), a submissão prévia e as vedações impostas na pendência da manifestação do Cade trazem relevantes consequências para as operações de fusões e aquisições (mergers and acquisitions - M&A).
Como se sabe, as operações de fusões e aquisições são comumente desdobradas em duas etapas: "signing" e "closing". A primeira consiste na assinatura dos contratos e a assunção das obrigações, e a segunda na sua efetiva execução (pagamento de preço e a entrega do ativo). A segunda fase fica sujeita à observância de determinadas condições, inclusive a aprovação pelos órgãos competentes, se necessária.
Ocorre que, não raras vezes, o lapso temporal entre a data da celebração do contrato de compra e venda de ações e a data da manifestação do Cade é demasiadamente longo, de modo que a situação financeira e patrimonial das sociedades envolvidas, e mesmo a conjuntura econômica, à época do closing podem vir a sofrer significativa variação, se comparadas à fotografia tirada na data da assinatura dos contratos.
Vale pontuar que cláusulas disciplinando a condução dos negócios da sociedade alvo durante o período entre o signing e o closing já vêm sendo utilizadas largamente nas operações de M&A. A novidade trazida pela nova lei é que, enquanto não houver decisão final do Cade, será necessário preservar as condições de concorrência entre elas, nos termos do parágrafo 4º do artigo 88 da lei em questão. A extensão dos efeitos do referido parágrafo ainda não foi estabelecida na doutrina e jurisprudência, mas é possível que, enquanto pendente a decisão final, as partes estejam vedadas de tomar, conjuntamente, decisões operacionais e estratégicas, ou simplesmente trocar informações empresariais.
Se esta for a abrangência do dispositivo, o adquirente estará alijado de participar de importantes decisões empresariais da sociedade adquirida, as quais podem trazer impactos adversos em seus negócios, afetando, inclusive, a participação no mercado (market share). Em outras palavras, por uma série de fatores, as premissas econômicas, financeiras e mercadológicas que balizaram os termos dos contratos podem ter sido materialmente alteradas na data do closing.
Como consequência, cláusulas comumente utilizadas para preservar a situação patrimonial e financeira da sociedade alvo entre signing e closing podem não mais ser mecanismos suficientemente satisfatórios para salvaguardar os interesses do comprador. De forma similar, cláusulas indenizatórias habitualmente utilizadas em operações do gênero poderão vir a se tornar insuficientes, diante das substanciais alterações nas condições financeiras e patrimoniais que podem ocorrer nas sociedades nesse ínterim.
Nessa linha, cláusulas conhecidas como MAE (material adverse effect), bastante difundidas na prática norte-americana, mas pouco aplicadas no direito pátrio, podem se tornar mais comuns nos contratos de M&A entre sociedades brasileiras. Por fim, eventuais litígios envolvendo a responsabilidade das partes por atos de gestão praticados antes da decisão do Cade poderão se tornar mais frequentes do que atualmente.
Em linhas gerais, o novo regime previsto na Lei nº 12.529 traz às empresas e aos agentes o desafio de redefinir os limites das obrigações e responsabilidades durante o intervalo, bem como os mecanismos contratuais mais apropriados de way out, vis-à-vis as possíveis alterações das premissas negociais tomadas à época da assinatura dos documentos. A prática irá se encarregar de apontar as soluções mais adequadas para a proteção dos interesses envolvidos.
Por Felipe de Freitas Ramos.
Fonte: Valor Econômico.
Com efeito, o artigo 88 da nova lei prevê que os atos de concentração (tais como fusão ou incorporação entre sociedades independentes ou aquisição de ações de controle), envolvendo empresas com faturamento anual bruto superior a R$ 400 milhões, não poderão ser consumados antes da apreciação final do Cade, devendo, enquanto a operação não for autorizada, ser preservadas as condições de concorrência. Isso significa que, enquanto a autarquia não se manifestar, uma série de medidas não poderão ser tomadas, tais como a integração de operações, criação de sinergia, ou a atuação coordenada.
Adicionalmente, o parágrafo 2º do mesmo artigo 88 estabelece que o exame do ato pela autarquia deverá ser concluído em até 240 dias contados da submissão, tendo sido suprimida, todavia, a aprovação tácita do ato na hipótese de ausência de manifestação até o término do prazo acima, conforme constava na redação do projeto de lei que deu origem à norma.
A prática irá se encarregar de apontar soluções para a proteção das partes
Embora louvável a alteração promovida pela Lei nº 12.529 (que, vale lembrar, alinha a sistemática legal brasileira às melhores práticas internacionais), a submissão prévia e as vedações impostas na pendência da manifestação do Cade trazem relevantes consequências para as operações de fusões e aquisições (mergers and acquisitions - M&A).
Como se sabe, as operações de fusões e aquisições são comumente desdobradas em duas etapas: "signing" e "closing". A primeira consiste na assinatura dos contratos e a assunção das obrigações, e a segunda na sua efetiva execução (pagamento de preço e a entrega do ativo). A segunda fase fica sujeita à observância de determinadas condições, inclusive a aprovação pelos órgãos competentes, se necessária.
Ocorre que, não raras vezes, o lapso temporal entre a data da celebração do contrato de compra e venda de ações e a data da manifestação do Cade é demasiadamente longo, de modo que a situação financeira e patrimonial das sociedades envolvidas, e mesmo a conjuntura econômica, à época do closing podem vir a sofrer significativa variação, se comparadas à fotografia tirada na data da assinatura dos contratos.
Vale pontuar que cláusulas disciplinando a condução dos negócios da sociedade alvo durante o período entre o signing e o closing já vêm sendo utilizadas largamente nas operações de M&A. A novidade trazida pela nova lei é que, enquanto não houver decisão final do Cade, será necessário preservar as condições de concorrência entre elas, nos termos do parágrafo 4º do artigo 88 da lei em questão. A extensão dos efeitos do referido parágrafo ainda não foi estabelecida na doutrina e jurisprudência, mas é possível que, enquanto pendente a decisão final, as partes estejam vedadas de tomar, conjuntamente, decisões operacionais e estratégicas, ou simplesmente trocar informações empresariais.
Se esta for a abrangência do dispositivo, o adquirente estará alijado de participar de importantes decisões empresariais da sociedade adquirida, as quais podem trazer impactos adversos em seus negócios, afetando, inclusive, a participação no mercado (market share). Em outras palavras, por uma série de fatores, as premissas econômicas, financeiras e mercadológicas que balizaram os termos dos contratos podem ter sido materialmente alteradas na data do closing.
Como consequência, cláusulas comumente utilizadas para preservar a situação patrimonial e financeira da sociedade alvo entre signing e closing podem não mais ser mecanismos suficientemente satisfatórios para salvaguardar os interesses do comprador. De forma similar, cláusulas indenizatórias habitualmente utilizadas em operações do gênero poderão vir a se tornar insuficientes, diante das substanciais alterações nas condições financeiras e patrimoniais que podem ocorrer nas sociedades nesse ínterim.
Nessa linha, cláusulas conhecidas como MAE (material adverse effect), bastante difundidas na prática norte-americana, mas pouco aplicadas no direito pátrio, podem se tornar mais comuns nos contratos de M&A entre sociedades brasileiras. Por fim, eventuais litígios envolvendo a responsabilidade das partes por atos de gestão praticados antes da decisão do Cade poderão se tornar mais frequentes do que atualmente.
Em linhas gerais, o novo regime previsto na Lei nº 12.529 traz às empresas e aos agentes o desafio de redefinir os limites das obrigações e responsabilidades durante o intervalo, bem como os mecanismos contratuais mais apropriados de way out, vis-à-vis as possíveis alterações das premissas negociais tomadas à época da assinatura dos documentos. A prática irá se encarregar de apontar as soluções mais adequadas para a proteção dos interesses envolvidos.
Por Felipe de Freitas Ramos.
Fonte: Valor Econômico.
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